Argumentação no ensino de ciências: construções com a escola

Leitora privilegiada deste livro antes de sua publicação em razão do convite feito pelas organizadoras para escrever o prefácio, busquei um caminho para falar das riquezas da obra, sem retirar dos leitores e leitoras o prazer das descobertas. Se ler é caçar em terras alheias, como propôs Michel de Certeau, é desejável cautela para não dizer antes do que foi dito pelos autores e pelas autoras, deixando as melhores surpresas à espera do olhar leitor, curioso, que percorrerá as páginas a seguir em sua busca particular. Assim, optei por não falar de méritos e valores de cada capítulo que  compõe a obra, deixando este caminho para leitores e leitoras. Mas, nessas ricas e complexas terras alheias, encontrei uma pergunta que destaco, pois ela dirigiu meu pensamento e minha escrita na produção deste texto. Lançada com sabor de desafio e provocação, a pergunta pode desvelar significados desta obra que tenho o prazer de prefaciar e que me conduziu a revisitar raízes profundas do nosso modo de olhar para a docência e para o ensino. “Por que não escrevemos um livro?” – indagam professores diante dos resultados de um árduo trabalho formativo do qual participaram. Pode parecer uma pergunta feita com frequência no espaço escolar, mas não é usual em nossa sociedade que professores e professoras presentes nas salas de aula da Educação Básica, ensinando crianças e jovens, escrevam livros sobre seu trabalho ou outros temas. Por que poucos se tornam autores de obras técnicas ou literárias, editadas e publicadas para circular em livrarias e bibliotecas? Para mim, a pergunta e suas possíveis respostas remetem à existência de uma relação desigual estabelecida e consolidada histórica e socialmente entre sujeitos que têm no conhecimento o seu objeto de trabalho – os professores. Este é o primeiro ponto para o qual desejo chamar a atenção. Professora da Educação Básica por duas décadas antes de me tornar professora da Universidade Federal do Paraná, tenho abordado essa questão em diferentes oportunidades e textos como parte de minhas reflexões, pesquisas e práticas, mas também a partir das experiências vividas. Pode-se dizer que, socialmente, a autorização para a produção de obras científicas tem sido reservada, de forma geral, aos professores e professoras que atuam no Ensino Superior. Frequentemente associada à sua função de pesquisadores e pesquisadoras, e em alguma medida decorrente de relações com a extensão, a produção de artigos, capítulos e livros é uma condição para o seu desenvolvimento profissional e constitui exigência na constituição da carreira acadêmica. Cria-se, assim, a distinção (no sentido usado por Pierre Bourdieu) entre professores produtores de ciência e outros que, distantes da produção, consomem e transmitem conhecimentos. Dessa autorização para a produção científica, e como contrapartida, decorre a definição de regras contratuais de trabalho que, especialmente nas universidades públicas, estabelecem outra condição de distinção: horas de trabalho pagas para a produção de textos científicos, editais de apoio à revisão de textos e à publicação de livros e incentivos à participação de eventos científicos. O campo científico, como mostra Bourdieu, é espaço de disputas entre os agentes para garantir acesso aos contextos de publicação qualificada, bem como aos recursos financeiros que garantem melhores condições de disputar melhores posições nesse campo.

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Leitora privilegiada deste livro antes de sua publicação em razão do convite feito pelas organizadoras para escrever o prefácio, busquei um caminho para falar das riquezas da obra, sem retirar dos leitores e leitoras o prazer das descobertas. Se ler é caçar em terras alheias, como propôs Michel de Certeau, é desejável cautela para não dizer antes do que foi dito pelos autores e pelas autoras, deixando as melhores surpresas à espera do olhar leitor, curioso, que percorrerá as páginas a seguir em sua busca particular. Assim, optei por não falar de méritos e valores de cada capítulo que  compõe a obra, deixando este caminho para leitores e leitoras. Mas, nessas ricas e complexas terras alheias, encontrei uma pergunta que destaco, pois ela dirigiu meu pensamento e minha escrita na produção deste texto. Lançada com sabor de desafio e provocação, a pergunta pode desvelar significados desta obra que tenho o prazer de prefaciar e que me conduziu a revisitar raízes profundas do nosso modo de olhar para a docência e para o ensino. “Por que não escrevemos um livro?” – indagam professores diante dos resultados de um árduo trabalho formativo do qual participaram. Pode parecer uma pergunta feita com frequência no espaço escolar, mas não é usual em nossa sociedade que professores e professoras presentes nas salas de aula da Educação Básica, ensinando crianças e jovens, escrevam livros sobre seu trabalho ou outros temas. Por que poucos se tornam autores de obras técnicas ou literárias, editadas e publicadas para circular em livrarias e bibliotecas? Para mim, a pergunta e suas possíveis respostas remetem à existência de uma relação desigual estabelecida e consolidada histórica e socialmente entre sujeitos que têm no conhecimento o seu objeto de trabalho – os professores. Este é o primeiro ponto para o qual desejo chamar a atenção. Professora da Educação Básica por duas décadas antes de me tornar professora da Universidade Federal do Paraná, tenho abordado essa questão em diferentes oportunidades e textos como parte de minhas reflexões, pesquisas e práticas, mas também a partir das experiências vividas. Pode-se dizer que, socialmente, a autorização para a produção de obras científicas tem sido reservada, de forma geral, aos professores e professoras que atuam no Ensino Superior. Frequentemente associada à sua função de pesquisadores e pesquisadoras, e em alguma medida decorrente de relações com a extensão, a produção de artigos, capítulos e livros é uma condição para o seu desenvolvimento profissional e constitui exigência na constituição da carreira acadêmica. Cria-se, assim, a distinção (no sentido usado por Pierre Bourdieu) entre professores produtores de ciência e outros que, distantes da produção, consomem e transmitem conhecimentos. Dessa autorização para a produção científica, e como contrapartida, decorre a definição de regras contratuais de trabalho que, especialmente nas universidades públicas, estabelecem outra condição de distinção: horas de trabalho pagas para a produção de textos científicos, editais de apoio à revisão de textos e à publicação de livros e incentivos à participação de eventos científicos. O campo científico, como mostra Bourdieu, é espaço de disputas entre os agentes para garantir acesso aos contextos de publicação qualificada, bem como aos recursos financeiros que garantem melhores condições de disputar melhores posições nesse campo.

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